Resumo: Artigo 36356
Redes e controvérsias: ferramentas para uma cartografia da dinâmica psicossocial (93, 108, 46, 115, 102)
Rosa Pedro, UFRJ, Brazil.
Apresentação: Thursday, May 29, 2008 3:45PM - 5:45PM sala 203 - UNIRIO VII ESOCITE - Sessão 3 - Chair: Ronald Arendt
Abstract.
O tema das redes tem ocupado cada vez mais espaço em estudos recentes, atravessando diferentes campos do saber, e articulando em torno de si um campo polissêmico que se constitui em verdadeiro desafio para os pesquisadores - afinal de contas, do que estamos falando quando falamos rede? Mesmo sem a pretensão de se chegar a uma resposta última ou verdadeira, reconhecemos que há muito o que problematizar acerca da constituição/produção das redes, sua dinâmica, sua formas de expressão, além da necessidade de se investir em metodologias que possam apreender a complexidade de tais dinâmicas. O presente trabalho objetiva explorar a pertinência e fertilidade da perspectiva sócio-técnica para a pesquisa psicossocial. Parte-se da consideração de que o que convencionamos chamar de campo psicossocial não pode ser explicado apenas por suas influências, contradições, interesses e tensões internas os humanos entre si mas, antes, emerge como um efeito heterogêneo de agenciamentos entre humanos e não humanos, cuja compreensão requer conceitos que estejam em ressonância com tal constituição híbrida. Os objetos técnicos que permeiam nosso cotidiano não são aqui concebidos como meros instrumentos a serviço da sociedade ou como suporte de algo que lhes é externo. Trata-se, antes de agentes/actantes capazes de engendrar transformações que ultrapassam o âmbito técnico-instrumental, participando da configuração de processos que não mais podemos definir como estritamente sócio-culturais passamos a nos referir a eles, doravante, como sócio-técnicos. Simultaneamente, pretende-se trazer como ferramenta para a apreensão destes coletivos sóciotécnicos a cartografia de controvérsias uma metodologia que apresenta ressonância com aspectos que parecem singularizar as redes, tais como complexidade, fluidez, heterogeneidade. Cartografar as controvérsias parece-nos uma tarefa decisiva para nos aproximarmos do que Bruno Latour propõe como principal diretriz metodológica para o estudo prático das redes: seguir os atores (LATOUR, 2000) e deixá-los falar, o que possibilita apreender a rede tal como ela se faz. Em outras palavras, trata-se de evidenciar o jogo de traduções recíprocas que se encontra em funcionamento nos coletivos, jogo esse que coloca em cena interesses, influências, resistências processos partilhados por humanos e não-humanos. A tradução implica um deslocamento, um desvio de rota, uma mediação ou invenção de uma relação antes inexistente e que, de algum modo, modifica os atores nela envolvidos portanto, que modifica a rede. Nesse sentido, o caráter provisório, incerto e ensaístico da cartografia de controvérsias pode ser tomado em sua positividade, e não como um déficit em relação a outras metodologias consagradas. Trata-se de uma estratégia de investigação que parece ir na contramão da tradição científica, pois se volta não para os conhecimentos já solidificados mas para as situações de incerteza, risco e conflito. Inúmeros pesquisadores no âmbito da sociologia das ciências e das técnicas têm defendido, inclusive, o estudo de controvérsias como uma poderosa ferramenta metodológica para nos aproximarmos da compreensão da sociedade tal como ela se faz (CALLON, 1999, p. 100). Juntamente com instrumentos já tradicionais e consagrados, tais como surveys, entrevistas, observação participante, análises estatísticas, defende-se a fecundidade de se acompanhar as controvérsias nas quais os diferentes atores sociais se envolvem. Como argumenta Dominique Vinck, As controvérsias são lugares privilegiados de observação para o sociólogo. Elas fazem aparecer diferentes atores, bem como o que eles mobilizam na construção e desconstrução dos fatos (...). A natureza dos argumentos utilizados e sua contingência permite colocar em evidência processos sociais que poderiam estar dissimulados. (VINCK, 1995, p. 116). Trata-se, argumentamos, do reconhecimento de que procedimentos experimentais e regras objetivas, por um lado, e o contexto social, por outro, não são suficientes para dar conta das direções que vão sendo priorizadas pelos coletivos. Torna-se, assim, decisivo mapear os principais temas mobilizadores, as retóricas que fundamentam os argumentos dos atores e os processos de resolução (quando houver) das disputas. Com base na cartografia assim delineada, é possível encontrar uma objetividade que não repousa mais em um silêncio admirativo, mas antes emerge do conjunto de traduções/versões distintas e, por vezes, contraditórias.