Resumo: Artigo 35929
Realismo científico e construtivismo sócio-lingüístico em Bruno Latour e Ludwik Fleck. (59, 66, 67, 90, 93, 96)
Carlos Alvarez Maia, UERJ, Brazil.
Apresentação: Wednesday, May 29, 2008 3:45PM - 5:45PM sala 201 - UNIRIO VII ESOCITE - Sessão 21 - Chair: Flavio Edler
Abstract.
Entre os dilemas contemporâneos, especialmente nos Science Studies, encontra-se a questão do relativismo sociológico e lingüístico que se opõe a uma compreensão realista do mundo, tal como a que ocorre nas ciências naturais. Já desde Mannheim paira sobre a sociologia a acusação de relativismo e de ser impotente para tratar da produção científica efetiva. Instituíram-se dicotomias encadeadas interno-externo, natureza-cultura, objetividade-subjetividade, natural-social que demarcam espaços próprios e excludentes para a ação cognitiva das hard sciences e das soft sciences. Esses registros marcaram as dificuldades para a constituição de uma história e uma sociologia da ciência efetivamente vinculadas aos marcos teórico-conceituais das soft sciences, durante grande parte do século XX. Em anos mais recentes, décadas de 1970/1980, novo ingrediente das ciências humanas tornou essa polarização ainda mais conflitante. Trata-se do discursive turn que alçou a linguagem como constitutiva da realidade social e assim abalou-se ainda mais a compreensão objetivista e realista do conhecimento científico. Nesse relativismo radical somente os agentes discursivos em sociedade eram considerados construtores da realidade. Na tentativa de ultrapassar tais rupturas, a orientação de Callon-Latour resgatou o compromisso com um realismo redesenhado que salta do realismo cientificista e incorpora matizes construtivistas. Essa proposta é escudada pelo princípio de simetria que promove uma equivalência entre os dois tipos de agenciamentos um, realista, dado pelas coisas do mundo e outro, construtivista, dado pelos agentes sociais humanos. Assim, retomam alguns elementos do antigo realismo e consideram a paridade de agenciamento entre os humanos e os não-humanos. Ambos passam a ser considerados como agentes construtores, simetricamente instituídos. Tratam-se de duas modalidades de agentes que interagem, entre si, produzindo uma realidade simultaneamente social e natural. Este passo foi fundamental para refinar nossa compreensão do saber científico, entretanto persistem dificuldades nesta simetrização. Especialmente duas: 1 Ao perder seu caráter distintivo, o humano em Callon-Latour é descaracterizado como um ser historicamente constituído. Tanto na instância filogenética da formação histórica da condição humana que estimula o gênero, a espécie humana, quanto na instância ontogenética da formação histórica de cada indivíduo como pessoa humana, em seu devir particularizdo. Na lógica da simetria há que se delinear um espaço para as ciências históricas, aquelas classicamente denominadas ciências humanas. 2 Ao postular pelo agenciamento simétrico entre coisas e humanos, há que se explicitar a forma específica pela qual este agenciamento recíproco efetivamente ocorre. Tanto Callon quanto Latour simplesmente o fazem através de dramatizações metafóricas que advogam um hilozoísmo improvável. As coisas são antropomorfizadas em diálogos volitivos com os humanos, revelando um antropocentrismo desnecessário. O modo concreto pelo qual as coisas interagem com os humanos fica sem explicação. A metáfora callon-latouriana que resgata também o antigo animismo das coisas do mundo oculta aquilo que merecia uma atenção mais precisa. Para corrigir esses aspectos da proposta de simetria, convoco Ludwik Fleck que incorpora a útil noção de um agenciamento recíproco entre coisas e humanos, e a relocaliza em um cenário mais adequado para as ciências históricas do homem, sem a necessidade das narrativas metafóricas, animistas, de Callon e Latour. Em Fleck, os humanos interagem com as coisas sem anularem sua condição histórica, de seres constituídos em humanos através da linguagem. Com a adição de Fleck, o realismo científico e o construtivismo sócio-lingüístico encontram uma síntese harmônica e, além disso, está mais afinada com o pensamento histórico que postula por uma identidade para a pessoa humana.