Resumo: Artigo 35867
Considerações sobre os conceitos de recalcitrância e de plasma e sua relação com o conceito de não domínio na obra de Bruno Latour (89, 93, 102, 108, 112, 115)
Ronald Arendt, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brazil.
Apresentação: Friday, May 30, 2008 3:45PM - 5:45PM sala 201 - UNIRIO VII ESOCITE - Sessão 9 - Chair: Antonio Arellano Hernandez
Abstract.
Atores se definem antes de tudo como obstáculos, escândalos, como aquilo que suspende o domínio, como aquilo que incomoda a dominação, como aquilo que interrompe o fechamento e a composição do coletivo afirma Latour. É pela noção de recalcitrância que convém principalmente definir sua ação, continua o autor (Latour, 1999a, p. 122). Em Latour (1999b) ele retoma o tema, argumentando que uma epistemologia política normativa alternativa deveria buscar pela recalcitrância em humanos e não humanos. Neste trabalho busco discutir o conceito de recalcitrância avaliando qual a medida deste escândalo e o que significaria o referido incômodo suscitado pelos atores. Porque deveríamos não evitá-los, mas buscá-los? Tendo mapeado o sentido que Latour dá à recalcitrância vou abordar, num segundo momento, outro conceito provocativo que emerge ao final do seu texto mais recente (Latour, 2006). Após sistematizar as bases da sociologia do ator-rede e propor uma concepção alternativa da sociedade e do conceito de social, o autor vem sublinhar um aspecto que ele mesmo considera surpreendente em seu projeto: trata-se da idéia de que a sociedade não dá conta de todos os acontecimentos. Se a topografia reticular e plana que ele buscou descrever em seu modelo estiver correta, o que existiria entre as malhas de um tal circuito? Um estado de não conexão, responde Latour, um plano de fundo ainda não formatado que ele chamará de plasma, uma realidade intersticial não feita de material social da qual saberíamos muito pouco. (Latour, 2006, p. 352). Para dar conta deste conceito Latour faz uso de um conjunto de metáforas: se o mundo social ocupasse o lugar de uma rede de metrô de uma cidade, o plasma seria todo o resto da cidade, todas as construções, todos os seus habitantes; o plasma seria como o campo, se considerássemos os recursos necessários para fazer viver uma cidade. O mundo não seria um continente sólido de fatos pontuado por alguns lagos de incerteza, mas um vasto oceano de incertezas semeado de algumas ilhas de formas calibradas e estabilizadas (p. 353). Pretendo mostrar como ambos os conceitos de recalcitrância e plasma estão relacionados à concepção mais geral de não domínio na sociologia das ciências de Latour. O não domínio se faz presente quanto aos não humanos quando, por exemplo, contra todas as expectativas dos cientistas um laboratório explode. Mas como ficaria o não domínio no que tange aos humanos? No contexto do projeto de pesquisa que desenvolvo no Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UERJ no qual busco traduzir para a psicologia social as propostas da sociologia do ator-rede penso ser legítimo descrever a ação dos atores humanos a partir da recalcitrância, do plasma e do não domínio. Ambos os conceitos poderiam contribuir para repensar não só a noção de sociedade, mas também a noção de indivíduo na psicologia social contemporânea. Uma série intrigante de perguntas de Latour ao comentar fenômenos que nos surpreendem frente ao tamanho de nossa ignorância abre esta possibilidade (p. 354): o Porque armadas atemorizantes desaparecem em uma semana? o Porque impérios inteiros - como o império soviético, se desfazem em alguns meses? o Porque empreendimentos que se estendem sobre toda a superfície do globo entram em falência após a publicação de suas últimas previsões trimestrais? o Porque as mesmas empresas passam em menos de um ano de uma situação alarmante a lucros enormes? o Porque cidadãos tranqüilos se transformam multidões revolucionárias? o Porque mornos agrupamentos de massa se tornam de repente assembléias alegres de cidadãos livres? o Porque acontece de um indivíduo sem qualidades passar subitamente à ação após ter recebido alguma obscura informação? o Como se faz que um músico linearmente acadêmico seja subitamente possuído pelo ritmo mais frenético? Vou argumentar que a resposta a tantos porquês deverá envolver não apenas o conceito de plasma mas também o de recalcitrância. Referências bibliográficas Latour, B. (1999a) Politiques de la nature. Comment faire entrer les sciences en démocratie. Paris : Éditions de la Découverte. Latour, B. (1999b) How to talk about the body? The normative dimension of science studies. Disponível em http://www.bruno-latour.fr/articles/1999.html Acessado em 31 de março de 2006 Latour, B. (2006) Changer de société. Refaire de la sociologie. Paris : Éditions de la Découverte. Fontes de financiamento: Programa Prociência/Faperj / UERJ