Resumo: Artigo 35537
Tecnologia social como pluralismo tecnológico (102, 107, 109, 115, 116, 117)
Ricardo Neder, UNB UNIVERSIDADE DE BRASILIA, Brazil.
Apresentação: Wednesday, May 29, 2008 1:15PM - 3:15PM sala 205 - UNIRIO VII ESOCITE - Sessão 1 - Chair: Renato Dagnino
Abstract.
(A) A TECNOLOGIA SOCIAL DIANTE DA TECNOCIÊNCIA - As políticas de fomento, incentivo e formação da tecnologia social (TS) tem como presssuposto o pluralismo tecnológico. Há dois sentidos para esta expressão: de um lado significa o oposto à tecnociência oficial ou derivada do ''mainstream'' da economia (cujo padrão de C&T está fortemente associado com padrões de inovação empresariais unidirecionados tecnologicamente). O segundo sentido é o do pluralismo dos sujeitos sociais como construtores de formas de Tecnologia Social (por exemplo, dirigidas para o desenvolvimento sustentável ou diferentes práticas de sustentabilidade). Tais vertentes que operam com o pluralismo colocam seus atores chaves em conflito com um movimento de caráter hegemônico para produção das tecnociências nas condições contemporâneas. Um exemplo disto: estas duas concepções e práticas - queiramos ou não - potencializadoras das inovações científicas, podem ser emblematicamente descritas no episódio da adesão da comunidade científica contemporanea que participa do desenvolvimento da tecnologia e patenteamento comercial de sementes transgênicas para o complexo agroindustrial, e, de outro lado - da emergência e expansão significativas em países como o Brasil e Índia, das práticas sociotécnicas em torno das agroecologias. Este conflito - intra-acadêmica e extra-acadêmico (para usar uma tipologia superada de origem mertoniana) entre pesquisadores, mercados e instituições econômicas, e os movimentos sociais - move os pesquisadores que apóiam os direitos de propriedade intelectuais (DPI) sob a forma de patentes de sementes transgênicas, e os que defendem a propriedade intelectual subordinada à sua eficiência como parte dos instrumentos públicos não redutíveis as determinações dos mercados. Estes instrumentos são públicos porque permitem a transmissão dos processos de aprendizagem comum e de uma ciência cujos resultados devem ser protegidos mas não capturados ou patenteados. No primeiro caso, das patentes de sementes transgênicas, abre-se um campo contraditório no qual a extensão das lógicas de mercado às atividades imateriais tornou necessárias modificações institucionais importantes relativas à legislação em termos de DPI e às diferentes formas de concorrência econômica (Veja-se o caso no Brasil das controvérsias surgidas no âmbito da CTNBio Comissão Técnica Nacional de Biossegurança que deu e continua dando origem à extensa legislação para regular a guerra econômica entre grandes corporações, entre si, a qual lança mão de todas as formas de retórica determinista na genética para alijar, como anti-ciência, a concepção de pesquisa científica que não compartilha dos pressupostos epistemológicos e tecnocientíficos dos contendores no campo da luta corporativa por DPI que constituem atividades imateriais. Os DPI dos transgênicos, entretanto, irão afetar os mercados agrícolas exportadores devido a regras de convenção . Tudo se passa como se este campo desta luta subsumisse todas as formas alternativas de fazer pesquisa & desenvolvimento, ciência & tecnologia ). (B) A TECNOLOGIA SOCIAL COMO INOVAÇÃO SOCIOTÉCNICA - Na sua origem a tecnologia social é uma tentativa de internalizar nas comunidades soluções práticas para as pessoas no seu dia-a-dia. Esse sentido de uma tecnologia-como-pé-no-chão também é característico das ações de intervenção da Economia Solidária. No Brasil a defesa da tecnologia social tem sido marcada pela ação, discurso e movimento concreto em torno de duas vertentes básicas. A primeira trabalha a tecnologia como inovação sociotécnica gerada pelos sujeitos sociais específicos no seu território comunitário e, portanto, como uma experiência que nasce em geral no circuito social e econômico das economias de vizinhança, onde moram as pessoas envolvidas. Nessa primeira acepção, a tecnologia não pode ser separada do sujeito social que lhe dá origem caso, por exemplo, da família produtora na agricultura familiar, das comunidades extrativistas; dos coletivos nos assentamentos da reforma agrária, das cooperativas populares em favelas nas grandes cidades; das associações dos povos riberinhos e população do semi-árido, ou ainda das associações que reúnem as mulheres-quebradeiras dos babaçuais no Nordeste brasileiro e, num limite máximo onde a economia se dissolve nos laços da comunidade, entre os povos indígenas). Em virtude dessa relação direta com a economia solidária ou comunitária, chamo tal vertente de sujeito-social-que-inova. A literatura especializada em tecnologia social vem destacando esta vertente assinalando que ela não seria possível sem os conhecimento tecnocientíficos; portanto, poderíamos definir como a principal característica deste modo de fazer tecnologia a questão do como se processa a interação do saber-fazer popular com o técnico & científico. Estamos diante da necessidade de propor outro modelo ao tradicional de aplicação e difusão tecnológica no qual a aplicação da tecnologia a um projeto prático acaba por disseminar resultados que se prestam a outros projetos políticos, e ficar à deriva de outros projetos que nada tem de comunitários ou de tecnologia social. Outra vertente atribui à tecnologia social a forma abstrata de metodologia, produto ou processo concreto que foi retirado da comunidade ou saiu da concepção do pesquisador, e daí foi sistematizada e convertida em solução ou modelo para problemas locais. Neste caso, embora a tecnologia tenha nascido de uma experiência ou pesquisa entre sujeitos sociais específicos parte-se da tentativa de reaplicar o modelo em escala ampliada, valendo-se das qualidades intrínsecas da tecnologia social. Tal é o caso do programa brasileiro de tecnologia social para construção de cisternas fechadas para armazenar água de chuva com base em soluções que ampliam sua escala de difusão para milhares de pequenos produtores familiares no semi-árido. Podemos chamar essa modalidade de tecnologia social de metodologias-sem-sujeito-social na medida em que ainda que seja uma tecnologia com um produto acabado que integra o circuito da reaplicação, ela não pode ser gerada sem componentes do tipo sujeito-que-inova . O que importa destacar é que para a primeira vertente seu foco é a construção sociotécnica pelo ou/e com o sujeito social. O objetivo básico é mobilizar/articular o fortalecimento da capacidade de auto-referência do sujeito na geração de inovação sociotécnica para resolver seus problemas. No caso da segunda vertente, tem sido muito postulada a necessidade de que é preciso tomar essas inovações sociotécnicas a fim de convertê-las em metodologia produto ou processo, passível de ser reaplicada em qualquer comunidade. (C) REDES SOCIAIS + REDES TÉCNICAS = REDES SOCIOTECNICAS Podemos notar a partir das situações acima, que ambas as vertentes (sujeito-que-inova e a metodologia-sem-sujeito) estão simultaneamente presentes nas experiências, políticas, arranjos institucionais, propostas, declarações e concepções educacionais e filosóficas, políticas e sociais do movimento de difusão da Tecnologia Social e da Economia Solidária no Brasil. Ambas dependem da ação de redes sociais, e da sua interação ou construção com as redes técnicas, sob a forma de assistência técnica, quadros gestores, pessoal de nível médio e técnico, agentes multiplicadores, professores, lideranças políticas que conhecem os problemas da difusão sociotécnica. O importante, me parece, é aprofundar o interacionismo ou fomento às redes sociotécnicas como base de um futuro binômio entre tecnologia social e uma forma específica de instituição de mercado identificada hoje com a economia solidária. Seus protagonistas iniciais são, por exemplo no Brasil, as incubadoras tecnológicas de cooperativas populares, sob o formato atual para expansão entre outras redes técnicas. A identificação do grau de adesão ou aderência das redes sociotécnicas ao binômio TS/ES é a essência da tecnologia social. (E que se aplica tanto para as ações, programas e políticas das políticas na vertente da metodologia-sem-sujeito, quanto nas similares sob a abordagem do sujeito-que-inova). _