Resumo: Artigo 36271
O sangue que circula entre nós: por uma etnografia do sangue (38,42,50)
Daniel Alves, Universidade Federal de Minas Gerais, Brazil.
Apresentação: Wednesday, May 29, 2008 1:15PM - 3:15PM sala 201 - UNIRIO VII ESOCITE - Sessão 48 - Chair: Márcia Regina Barros da Silva
Abstract.
A prática da transfusão sangüínea nos dias de hoje é recorrente através do desenvolvimento dos hemocentros. Contudo, o processo laboratorial pelo qual passa o sangue, entre o doador e o receptor, fica restrito a uma gama reduzida de profissionais altamente qualificados. Além disso, essa disseminação dos usos do sangue e seus derivados propiciam uma série de controvérsias e esquemas (simbólicos, científicos, políticos, econômicos, psicológicos, jurídicos, morais, religiosos, etc) necessários para que o sangue circule não nos corpos, mas também em nossas sociedades. Dito isto, sob o escrutínio de um olhar mais atento, sabe-se que as tentativas para se colocar o sangue em circulação entre a sociedade, através da técnica da transfusão, ocorreram de forma lenta e penosa passando por várias controvérsias sociais, científicas e tecnológicas, no decorrer da modernidade, alcançando seu desenvolvimento maior apenas no final do século XIX e início do século XX. A realidade do sistema de doação de sangue é bem mais recente: nos Estados Unidos adotou-se a doação a partir de 1979 e no Brasil, apenas a partir de 1980. Perante este quadro observei a necessidade de se compreender melhor o processo pelo qual o sangue é colocado em circulação na sociedade e de que maneira ele é transformado pelo laboratório para cumprir variados fins biológicos e sociais. Para tal exerço no momento um trabalho de campo com a proposição de se fazer uma etnografia do sangue. Resumidamente, isto consiste em entrar na rede de circulação social do sangue procurando acompanhá-lo nas veias e artérias de todo um complexo esquema montado em torno da técnica da transfusão. Um esquema que inicia com um doador individual (na verdade, vários indivíduos tratados caso a caso em minuciosa entrevista). Uma vez que este indivíduo estende os seus braços ao aparato técnico do hemocentro, seu sangue começa a ser retirado para iniciar uma longa viagem em meio aos expedientes do laboratório. Este sangue então é compartimentado, separado, purificado, minuciosamente analisado e, por fim, deixa o anonimato da natureza para exercer um agenciamento privilegiado na sociedade. O sangue é agido, posto em circulação, para fazer a sociedade também circular: circular em torno dele através da gama de pessoas, do médico, do biólogo, patologista aos técnicos que fabricam as máquinas de transformação do sangue. Fazer a sociedade circular ao devolvê-la indivíduos novamente repostos pelo uso terapêutico do sangue. Entre o doador e o receptor do sangue há todo um intrincado complexo, uma rede pulsante que merece ser observada. Uma rede também dos usos que se faz do sangue ao mesmo tempo em que este é posto em ação. Desta maneira, meu texto pretende informar e apresentar os resultados prévios deste trabalho, desta etnografia do sangue, procurando enfatizar os aspectos sociais que envolvem tanto o laboratório como a própria matéria sangüínea.